Por Edison Salles
[Texto lido por ocasião do debate: "20 anos da derrubada do Muro de Berlim", com Edison Salles e os profs. A. C. Mazzeo e M. Del Roio, ocorrido no campus Marília da UNESP, em 10-11-2009]
Boa noite a todos,
Há diversas formas de abordar o 1989 fazendo ressaltar a enorme importância extra-acadêmica desse tema de reflexão.
Fazendo justiça ao lugar onde estamos (o campus Marília da UNESP), quero pedir licença para anunciar desde já que buscarei dialogar sobretudo com o “autonomismo” entendido como “espírito de época” de nossos dias.
Ainda que só possa retornar a este ponto na parte conclusiva desta exposição, gostaria de deixar de antemão anunciado esse objetivo particular.
Algumas perguntas para iniciar
Em primeiro lugar, quando falamos da queda do Muro de Berlim, é preciso compreender o que foi que caiu e como e por que caiu. Que tipo de regime havia na Alemanha Oriental (RDA)?
Acho que vale a pena retornar a dois pontos anteriores, para responder a esta pergunta, isto é, teremos que nos deter um pouco na análise do caráter social do stalinismo e no papel novo que ele passou a exercer após o fim da 2ª Guerra.
Isso é essencial para evitar aquela tendência do pensamento a “naturalizar” os resultados prontos com que se depara. Ou seja, é preciso perguntar: como chegamos à divisão de um país imperialista de primeira ordem como a Alemanha? De início, é fácil ver que o processo dessa divisão teve muito pouco a ver com as divisões norte-sul que ocorreram no Vietnã e na Coréia – países que foram palco de grandes revoluções anticoloniais e cuja divisão foi subproduto de guerras civis em que o imperialismo interveio maciçamente, tendo a divisão do país como resultado a partir dos acordos que as duas superpotências do pós-guerra firmaram entre si.
Já no caso da Alemanha, o elemento de acordo entre as potências (EUA e URSS) foi muito mais determinante, até porque se impôs por fora e antes que qualquer processo revolucionário pudesse se desenvolver após a derrota de Hitler – e é importante termos em mente que as condições para que a Alemanha atravessasse uma situação revolucionária após 1945 eram totais.
Em todo caso, isso nos leva então ao problema da divisão do mundo em esferas de influência após a 2ª Guerra, o que nos obriga a entender, pelo menos em linhas gerais, tanto o caráter fundamental da época imperialista, como o caráter social do stalinismo. Por falta de tempo para desenvolver o primeiro, me deterei a seguir no segundo tema.
O caráter social do stalinismo
Como sabemos, o stalinismo, ou a burocracia stalinista que governava a URSS (e mais tarde dominou os PCs em todo o mundo) consolidou-se no poder a partir da derrota da revolução mundial, cujo ascenso mais vigoroso se deu na esteira do triunfo bolchevique na Rússia em 1917. Não há tempo aqui para nos determos nesse processo, mas para que tenhamos uma idéia basta afirmar que em toda a Europa central a guerra levou à queda dos velhos impérios e à ação revolucionária das massas: na Hungria chegaram a tomar o poder em 1919, na Bulgária e na Romênia chegou-se muito perto disso... Porém é na Alemanha que o destino da revolução mundial se jogava, e somente nesse país abriram-se processos revolucionários profundos em 1918-1919 e de novo em 1923 (além da famosa ação ultra-esquerdista de março de 1921, que não deixa de ser um sintoma da situação de conjunto). É fácil ver que um novo triunfo nesses países daria uma força invencível para que a revolução seguisse avançando rumo ao Oeste e também no mundo semicolonial.
Há diversas formas de abordar o 1989 fazendo ressaltar a enorme importância extra-acadêmica desse tema de reflexão.
Fazendo justiça ao lugar onde estamos (o campus Marília da UNESP), quero pedir licença para anunciar desde já que buscarei dialogar sobretudo com o “autonomismo” entendido como “espírito de época” de nossos dias.
Ainda que só possa retornar a este ponto na parte conclusiva desta exposição, gostaria de deixar de antemão anunciado esse objetivo particular.
Algumas perguntas para iniciar
Em primeiro lugar, quando falamos da queda do Muro de Berlim, é preciso compreender o que foi que caiu e como e por que caiu. Que tipo de regime havia na Alemanha Oriental (RDA)?
Acho que vale a pena retornar a dois pontos anteriores, para responder a esta pergunta, isto é, teremos que nos deter um pouco na análise do caráter social do stalinismo e no papel novo que ele passou a exercer após o fim da 2ª Guerra.
Isso é essencial para evitar aquela tendência do pensamento a “naturalizar” os resultados prontos com que se depara. Ou seja, é preciso perguntar: como chegamos à divisão de um país imperialista de primeira ordem como a Alemanha? De início, é fácil ver que o processo dessa divisão teve muito pouco a ver com as divisões norte-sul que ocorreram no Vietnã e na Coréia – países que foram palco de grandes revoluções anticoloniais e cuja divisão foi subproduto de guerras civis em que o imperialismo interveio maciçamente, tendo a divisão do país como resultado a partir dos acordos que as duas superpotências do pós-guerra firmaram entre si.
Já no caso da Alemanha, o elemento de acordo entre as potências (EUA e URSS) foi muito mais determinante, até porque se impôs por fora e antes que qualquer processo revolucionário pudesse se desenvolver após a derrota de Hitler – e é importante termos em mente que as condições para que a Alemanha atravessasse uma situação revolucionária após 1945 eram totais.
Em todo caso, isso nos leva então ao problema da divisão do mundo em esferas de influência após a 2ª Guerra, o que nos obriga a entender, pelo menos em linhas gerais, tanto o caráter fundamental da época imperialista, como o caráter social do stalinismo. Por falta de tempo para desenvolver o primeiro, me deterei a seguir no segundo tema.
O caráter social do stalinismo
Como sabemos, o stalinismo, ou a burocracia stalinista que governava a URSS (e mais tarde dominou os PCs em todo o mundo) consolidou-se no poder a partir da derrota da revolução mundial, cujo ascenso mais vigoroso se deu na esteira do triunfo bolchevique na Rússia em 1917. Não há tempo aqui para nos determos nesse processo, mas para que tenhamos uma idéia basta afirmar que em toda a Europa central a guerra levou à queda dos velhos impérios e à ação revolucionária das massas: na Hungria chegaram a tomar o poder em 1919, na Bulgária e na Romênia chegou-se muito perto disso... Porém é na Alemanha que o destino da revolução mundial se jogava, e somente nesse país abriram-se processos revolucionários profundos em 1918-1919 e de novo em 1923 (além da famosa ação ultra-esquerdista de março de 1921, que não deixa de ser um sintoma da situação de conjunto). É fácil ver que um novo triunfo nesses países daria uma força invencível para que a revolução seguisse avançando rumo ao Oeste e também no mundo semicolonial.
O isolamento internacional da URSS obrigou-os a enfrentar sozinhos os problemas de uma economia não apenas atrasada em seu conjunto, mas arruinada por vários anos de guerras. Como diria Trotsky, o que faz a burocracia não são as relações socialistas de propriedade, mas antes a escassez econômica. Marx havia dito que sem um regime social de abundância, a luta pelo básico iria retornar após a revolução e, com ela, “toda a velha merda”. Trotsky dirá que a falta do pão leva à formação das filas de racionamento, e quando estas se tornam grandes demais, surge a figura do policial que vigiará a fila e a do burocrata que decidirá para quem vai haver e para que não vai haver pão.
Do "burocratismo" ao Estado totalitário
Resumindo muito todo o processo entre a morte de Lênin (1924) e a situação na entrada da guerra (1939), podemos dizer que já Lênin morreu lutando (em acordo com Trotsky) contra o que ambos denominavam “burocratismo” no Estado soviético. Após sua morte, esses elementos de “burocratismo” avançam cada vez mais para conformar um corpo estável de funcionários, com interesses especiais, separados das massas. Abrindo as portas do Partido para uma enorme camada de arrivistas de todo tipo, e recusando-se a reintroduzir a liberdade de partidos soviéticos na URSS , Stalin tirou proveito da situação e conformou de maneira consciente um sistema de privilégios para uma camada social de dezenas de milhares e centenas de milhares de burocratas apartados dos milhões de operários e camponeses. Não ia tardar muito para que a manutenção desses interesses materiais separados e especiais começasse a se tornar diretamente antagônica a toda iniciativa ou autonomia mínimas por parte dos trabalhadores.
Isso significou que as campanhas caluniosas delirantes de perseguição à Oposição de Esquerda, que cresceram durante a segunda metade dos anos 1920, se transformassem em perseguição generalizada às massas e aos fuzilamentos em massa nos anos 1930. (Aqui vale um parêntese, pois não deixa de ser uma amarga ironia ler hoje em Lukács que ele apoiava até certo ponto as perseguições stalinistas quando eram contra a Oposição, porém rejeitava a utilização dos mesmos métodos contra a classe operária, quando esta foi apenas o desenvolvimento lógico do mesmo processo – afinal os ataques à Oposição já eram ataques à classe – mais uma mostra de que nem toda a inteligência e muito menos toda a erudição de Lukács o ajudaram a jamais compreender a verdadeira natureza do stalinismo – e que dirá combatê-lo corretamente).
Voltando ao tema, antes de chegarmos ao papel do stalinismo no pós 2ª guerra e a criação da RDA, temos que deixar ao menos apontado o impacto internacional do stalinismo. Resumindo, podemos dizer que já desde 1924 a burocracia de Moscou passou a intervir na Comintern e através dela em todos os PCs ao redor do mundo, transformando esses partidos em dóceis correias de transmissão de sua política, e lançando furiosas campanhas de calúnias, perseguições e expurgos de todos os revolucionários que se negavam a se submeter ao novo mando (vale dizer que não foram poucos os comunistas que, sem disporem de informações sobre o que se passava no Partido russo e na URSS, descobriram e aderiram assim ao trotskismo).
São 3 os principais exemplos do que significou essa domesticação dos PCs e posterior transformação destes em verdadeiras ferramentas para impedir a revolução: a revolução chinesa de 1925-1927; a capitulação diante de Hitler em 1933; a revolução espanhola (sobre este último vale a pena ver o excelente filme de Ken Loach, “Terra e Liberdade”).
A 2ª Guerra Mundial
A síntese de tudo isso é que a URSS chega à 2ª guerra novamente isolada do ponto de vista da revolução socialista (desta vez devido ao papel consciente do stalinismo para “organizar as derrotas” da classe operária), e internamente vive uma situação descrita por Trotsky como uma encruzilhada entre uma nova revolução operária que restabelecesse os sovietes, a planificação democrática, a liberdade de partidos soviéticos, e do outro lado, a restauração do capitalismo.
Na guerra, após a bizarra posição inicial de pacto com Hitler que significou entre outras coisas a divisão da Polônia, Stalin termina por se alinhar aos EUA e às “potências democráticas”. Até hoje existe toda uma historiografia (por exemplo, Hobsbawn) que parte disso para negar toda continuidade entre a 1ª e a 2ª guerras, apresentando a última como uma guerra de democracia X fascismo (“guerra de regimes”) e não uma nova guerra imperialista para completar a nova partilha do mundo que a 1ª guerra não conseguiu concluir. Mas o interessante para nós é que após a guerra a política de Stalin será tentar perpetuar os acordos com os EUA (já em 1943 Stalin dissolveu publicamente a Comintern com este fim) e perseguir uma política de “coexistência pacífica” com o imperialismo.
A 2ª Guerra Mundial
A síntese de tudo isso é que a URSS chega à 2ª guerra novamente isolada do ponto de vista da revolução socialista (desta vez devido ao papel consciente do stalinismo para “organizar as derrotas” da classe operária), e internamente vive uma situação descrita por Trotsky como uma encruzilhada entre uma nova revolução operária que restabelecesse os sovietes, a planificação democrática, a liberdade de partidos soviéticos, e do outro lado, a restauração do capitalismo.
Na guerra, após a bizarra posição inicial de pacto com Hitler que significou entre outras coisas a divisão da Polônia, Stalin termina por se alinhar aos EUA e às “potências democráticas”. Até hoje existe toda uma historiografia (por exemplo, Hobsbawn) que parte disso para negar toda continuidade entre a 1ª e a 2ª guerras, apresentando a última como uma guerra de democracia X fascismo (“guerra de regimes”) e não uma nova guerra imperialista para completar a nova partilha do mundo que a 1ª guerra não conseguiu concluir. Mas o interessante para nós é que após a guerra a política de Stalin será tentar perpetuar os acordos com os EUA (já em 1943 Stalin dissolveu publicamente a Comintern com este fim) e perseguir uma política de “coexistência pacífica” com o imperialismo.
É nesse marco então que se faz a divisão da Alemanha, por sobre qualquer possibilidade de autodeterminação das massas alemãs. A derrota na guerra livrava os alemães do odioso regime nazi, mas os fez deparar-se com o fato consumado de que outras potências, sentadas ao redor de uma mesa, decidiram o futuro de sua nação.
O stalinismo, que no mesmo momento atuava de maneira decisiva para desarmar a resistência das massas, impedir qualquer possibilidade revolucionária nos países centrais, chamando os trabalhadores a darem as mãos aos burgueses na reconstrução do capitalismo europeu, chegava então a um novo extremo, aceitando o plano imperialista de dividir a Alemanha em “protetorados” que garantissem que não voltariam a ocorrer os sucessos de 1918 (a grande revolução que a 1ª guerra pariu).
Nesse sentido, os primeiros anos após 1945 serão marcados por duas espécies de processos bem distintos. De um lado, na Iugoslávia e depois na China, temos situações em que o chefe stalinista local (o marechal Tito, o comandante Mao Zedong) se vê obrigado pelas circunstâncias a tomar o poder, mesmo contrariando Stalin e contrariando suas próprias intenções iniciais. De outro lado, temos os países do Leste europeu, incluída a RDA, onde é o processo de tutela política por funcionários indicados por Moscou, ligado ao aumento da hostilidade imperialista com a Guerra Fria (após 1947), que leva a expropriações “em frio”, ou seja, sem uma participação efetiva das massas. São “Estados operários” no sentido de que ali se aboliu a propriedade privada e se estabeleceu a nacionalização e a planificação central da economia. Mas são também Estados monstruosamente deformados, questão que é ainda agravada pelo fato de que essas “expropriações sem revolução” (propriamente dita) são controladas por uma economia de comando onde se introduz um importante elemento de opressão nacional.
As revoluções operárias contra o stalinismo
Falando muito brevemente, esta situação leva a que sejam justamente esses países do Leste europeu que constituam o palco para as maiores revoluções operárias antistalinistas, ou em certa medida, as maiores revoluções operárias do pós-guerra em geral. Não seria possível analisar minuciosamente cada um dos processos (nem muito menos) mas basta termos em mente as seguintes datas: Berlim 1953, Hungria e Polônia 1956; Polônia e Tchecoslováquia 1968; Polônia 1980. Todos esses processos, e sobretudo os da Hungria e o de Berlim, foram processos em que a centralidade e a iniciativa operária comprovaram a acuidade do programa da IV Internacional (Programa de Transição) sobre o caráter e as reivindicações daquilo que Trotsky chamou de “revolução política” (e cujo alcance ultrapassa e muito as reformas “políticas”, diga-se para evitar falsas discussões) para os países dominados pelo stalinismo. Em particular a enorme atividade dos conselhos operários em 1956 e os chamados dos trabalhadores húngaros a que os russos permitissem que eles construíssem o socialismo por si mesmos (rejeitando explicitamente qualquer possibilidade de restauração do capitalismo) é a expressão máxima de que de fato era necessária uma nova revolução operária para colocar tais países na rota do socialismo. (Também na RDA os operários falavam em um “governo metalúrgico”, e não em retorno ao capitalismo.)
As revoluções operárias contra o stalinismo
Falando muito brevemente, esta situação leva a que sejam justamente esses países do Leste europeu que constituam o palco para as maiores revoluções operárias antistalinistas, ou em certa medida, as maiores revoluções operárias do pós-guerra em geral. Não seria possível analisar minuciosamente cada um dos processos (nem muito menos) mas basta termos em mente as seguintes datas: Berlim 1953, Hungria e Polônia 1956; Polônia e Tchecoslováquia 1968; Polônia 1980. Todos esses processos, e sobretudo os da Hungria e o de Berlim, foram processos em que a centralidade e a iniciativa operária comprovaram a acuidade do programa da IV Internacional (Programa de Transição) sobre o caráter e as reivindicações daquilo que Trotsky chamou de “revolução política” (e cujo alcance ultrapassa e muito as reformas “políticas”, diga-se para evitar falsas discussões) para os países dominados pelo stalinismo. Em particular a enorme atividade dos conselhos operários em 1956 e os chamados dos trabalhadores húngaros a que os russos permitissem que eles construíssem o socialismo por si mesmos (rejeitando explicitamente qualquer possibilidade de restauração do capitalismo) é a expressão máxima de que de fato era necessária uma nova revolução operária para colocar tais países na rota do socialismo. (Também na RDA os operários falavam em um “governo metalúrgico”, e não em retorno ao capitalismo.)
Com isso chegamos à parte final desta exposição.
O destino de todos aqueles processos de revolução política proletária contra as burocracias stalinistas foi um só: foram invariavelmente esmagados em sangue (coisa que Moscou tentava legitimar diante da opinião pública de esquerda no mundo caluniando os processos como intentos restauracionistas patrocinados pelo imperialismo).
A história demonstrou, pelo contrário, que a vitória daquelas revoluções, ajudadas por novos triunfos revolucionários nos países de economia avançada, era a única forma de defender o socialismo e evitar a restauração. Mais ainda, a história mostrou que os verdadeiros restauracionistas se encontravam apenas entre os burocratas, e isso se viu no Leste, na URSS, na China (e hoje se vê em Cuba). Os mesmos chefes que não hesitaram em afogar em sangue as reivindicações democráticas e socialistas das massas, foram os que cederam aos imperialistas e abriram as portas para que os produtos capitalistas minassem por dentro os regimes apodrecidos e as economias estagnadas. Foram os mesmos que depois se apressaram para apropriar-se dos despojos da economia planificada, dando origem ao capitalismo mafioso que se instaurou após fins dos anos 1980.
Das revoluções derrotadas ao ano 1989
No entanto, o título da atividade usa a palavra “derrubada” e não simplesmente “queda” do Muro. E isso é verdade: em 1989 as massas saíram às ruas e sua ação ajudou a pôr fim aos regimes do mal chamado “socialismo real”. Sobre isso, queria apenas chamar a atenção para dois pontos: a) por mais que se estude os processos, não se encontram sinais de que houvesse uma clara intencionalidade naquelas ações no sentido de restaurar a propriedade privada capitalista. Antes disso, o que vemos é que o ódio delas aos regimes opressivos em que viviam estava carente de uma alternativa clara do que fazer; e assim, aqueles regimes totalmente carcomidos por dentro, ruíram de uma vez e disso o imperialismo pôde se aproveitar para, patrocinando arrivistas como Yeltsin, restaurar oficialmente o capitalismo (o que jamais nos poderia fazer esquecer que a restauração é um processo muito mais complexo e profundo, que se iniciou antes e se estendeu além desses momentos); b) o agudo contraste entre aqueles processos abertos em 1989, processos populares, sem direção clara e sem auto-organização efetiva das massas, e os processos citados anteriormente, como a revolução húngara de 1956; ao contrário desta, o 1989 nos diversos países (e mesmo na China, onde foi sufocado pela burocracia e nem por isso a restauração foi menos impiedosa) não possuiu qualquer centralidade operária, e muito menos tendências soviéticas desenvolvidas.
O destino de todos aqueles processos de revolução política proletária contra as burocracias stalinistas foi um só: foram invariavelmente esmagados em sangue (coisa que Moscou tentava legitimar diante da opinião pública de esquerda no mundo caluniando os processos como intentos restauracionistas patrocinados pelo imperialismo).
A história demonstrou, pelo contrário, que a vitória daquelas revoluções, ajudadas por novos triunfos revolucionários nos países de economia avançada, era a única forma de defender o socialismo e evitar a restauração. Mais ainda, a história mostrou que os verdadeiros restauracionistas se encontravam apenas entre os burocratas, e isso se viu no Leste, na URSS, na China (e hoje se vê em Cuba). Os mesmos chefes que não hesitaram em afogar em sangue as reivindicações democráticas e socialistas das massas, foram os que cederam aos imperialistas e abriram as portas para que os produtos capitalistas minassem por dentro os regimes apodrecidos e as economias estagnadas. Foram os mesmos que depois se apressaram para apropriar-se dos despojos da economia planificada, dando origem ao capitalismo mafioso que se instaurou após fins dos anos 1980.
Das revoluções derrotadas ao ano 1989
No entanto, o título da atividade usa a palavra “derrubada” e não simplesmente “queda” do Muro. E isso é verdade: em 1989 as massas saíram às ruas e sua ação ajudou a pôr fim aos regimes do mal chamado “socialismo real”. Sobre isso, queria apenas chamar a atenção para dois pontos: a) por mais que se estude os processos, não se encontram sinais de que houvesse uma clara intencionalidade naquelas ações no sentido de restaurar a propriedade privada capitalista. Antes disso, o que vemos é que o ódio delas aos regimes opressivos em que viviam estava carente de uma alternativa clara do que fazer; e assim, aqueles regimes totalmente carcomidos por dentro, ruíram de uma vez e disso o imperialismo pôde se aproveitar para, patrocinando arrivistas como Yeltsin, restaurar oficialmente o capitalismo (o que jamais nos poderia fazer esquecer que a restauração é um processo muito mais complexo e profundo, que se iniciou antes e se estendeu além desses momentos); b) o agudo contraste entre aqueles processos abertos em 1989, processos populares, sem direção clara e sem auto-organização efetiva das massas, e os processos citados anteriormente, como a revolução húngara de 1956; ao contrário desta, o 1989 nos diversos países (e mesmo na China, onde foi sufocado pela burocracia e nem por isso a restauração foi menos impiedosa) não possuiu qualquer centralidade operária, e muito menos tendências soviéticas desenvolvidas.
A conclusão de tudo isso é que entramos nos anos 1990 com uma profunda crise de subjetividade operária, com a revolução desaparecendo do horizonte das massas, com uma enorme crise da esquerda e do próprio marxismo. Daí o gancho com o que dissemos no início, pois ao contrário de ceder aos encantos do “autonomismo”, que transforma todo o processo histórico em fonte de visões simplistas e preconceituosas contra o marxismo, contra o partido, contra a ditadura do proletariado, contra a luta de classes; ao contrário disso, o balanço correto dos fatos nos obriga a escovar a história a contrapelo para aprender as suas lições, que nos ensinam justamente a importância da luta de classes e de que os trabalhadores tomem o poder, que nos reforçam a necessidade de construir o partido revolucionário, nacional e internacional.
Obrigado.
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